Não entendo a poesia de Trakl, mas me deslumbra, e não há nada que me dê melhor a ideia de gênio.
Ludwig Wittgenstein
(...) recebi o “ Sebastião no Sonho ”, do qual muito já li: comovido, estupefato, cheio de pressentimentos e perplexidade; pois logo se entende que as circunstâncias desse soar ascendente e ressoar descendente foram irremediavelmente únicas, justamente como as que nascem do sonho. Tenho a sensação de que, mesmo para alguém próximo a Trakl, essas perspectivas e visões só aparecem como se através de vidros, como se excluído delas: pois a experiência de Trakl é como uma sucessão de reflexos e preenche todo o seu espaço, inacessível qual o espaço do espelho.
Rainer Maria Rilke
Trakl pertence à estirpe dos poetas videntes na que figuram Blake, Hölderlin, Rimbaud, Lautréamont e Artaud. Poetas que penetraram no obscuro do mundo e no obscuro do homem.
Aldo Pellegrini
Nativo de Salzburgo, ele nascera não na pequena Áustria de hoje, mas no grande império dos Habsburgos. Um império que não se imaginava à beira do colapso. Somente duas características distinguiram-lhe a vida: as drogas nas quais se viciara e a poesia.
Reconhecido por pessoas tão diferentes quanto os filósofos Wittgenstein, que apesar de admirá-lo, dizia não compreendê-lo, e Heidegger, que procurou decifrar sua “ambígua ambiguidade” ( sic ). Trakl tornou-se, através dos poemas escritos sobretudo nos seus dois últimos anos, o maior dos expressionistas e um poeta de exceção que, estabelecendo o nexo entre a loucura de Hölderlin e o desespero de Celan, tem sido cultuado quase secretamente por um sem-número de leitores devotos. Aos quais, graças ao belo trabalho tradutório de Claudia Cavalcanti, podem juntar-se afinal os brasileiros.
Pois, mais do que o vício, é sua poesia que prefigura o próprio e outros fins. Uma poesia de declínios e ocasos, desintegração e ruínas, decomposição e lindas mortes. Uma poesia orientada para um ocidente-poente ( Abendland ) que é a terra do entardecer ( Abend ), onde os animais são azuis e dorme-se um sono branco. Uma poesia dolorosamente imbuída da doença do mundo ao seu redor, descrente de qualquer cura e nostálgica de um tempo inconcebivelmente remoto.
Foi Heine que, canceroso, agonizando em seu leito-esquife, escreveu: “Dormir é bom; morrer, melhor; o certo, porém, seria nunca ter nascido”. Trakl considerava-se apenas seminascido. O suicídio servira menos para matá-lo do que para abortar seu completo nascimento. Tratava-se, portanto, da consumação natural da nostalgia de seus poemas sob a forma de um derradeiro mergulho amniótico no antes ― não depois ― da vida, do pecado e da queda.
Nelson Ascher
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